Lançamento de Cluster Portuguese Circularity (CPC)
- digimatria
- 18 de nov.
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O lançamento do Cluster Portuguese Circularity (CPC) no dia 18 de Novembro marcou um momento relevante para o ecossistema nacional da economia circular, reunindo entidades públicas, empresas, centros de investigação e estruturas de apoio ao empreendedorismo.
Portugal a Entrar na Circularidade: o Impulso do CPC
A sessão de abertura, conduzida por João Nunes, presidente do CECOLAB, e por Aires Pereira, presidente da Associação Smart Waste Portugal (ASWP), enfatizou a importância estratégica do cluster para reforçar a competitividade do país num contexto europeu cada vez mais exigente. Ambos salientaram que Portugal precisa de acelerar a transição circular e colocar as suas iniciativas no radar europeu, criando massa crítica e abrindo caminho à cooperação internacional.

Aires Pereira destacou o papel determinante dos membros da ASWP e das organizações que integram o CPC, recordando que a circularidade está longe de ser apenas um conceito ambiental: trata-se de uma transformação económica, industrial e cultural. Com uma taxa de circularidade nacional ainda situada nos 2,8%, bastante abaixo da média europeia de 11%, reforçou a urgência de aumentar a vida útil dos materiais, fomentar novos modelos de negócio e envolver ativamente os setores industriais. Sublinhou igualmente que a celebração dos dez anos da ASWP coincide com uma nova fase para o país, onde se pretende consolidar práticas circulares e aproximar a economia portuguesa das metas definidas pela Comissão Europeia.

Seguiu-se a participação de Octávio Borges, da direção de Empreendedorismo e Inovação do IAPMEI, que reforçou o papel dos clusters como motores de competitividade e de internacionalização. Ao referir que Portugal possui um volume de negócios industrial superior a 112 mil milhões de euros, sublinhou que a colaboração entre empresas — sobretudo entre grandes empresas, PME e startups — é decisiva para alcançar taxas de crescimento superiores a 35%. Destacou ainda que o CPC pode funcionar como um espaço de articulação de políticas públicas, monitorização de oportunidades, partilha de informação sobre financiamentos e criação de visibilidade para iniciativas inovadoras. O otimismo, disse, não deve ser ingénuo, mas sustentado na capacidade real de crescer através da cooperação.

Na sequência, Luís Matias, coordenador da IIBT Pinhal Interior, chamou a atenção para a necessidade de reforçar a coesão territorial. Referiu que muitas regiões do interior carregam um sentimento de abandono, mas sublinhou exemplos modelares como o BLC3, em Lagares da Beira, demonstrando que a inovação é possível mesmo em territórios menos favorecidos. O CPC, afirmou, pode contribuir para diminuir assimetrias e aproximar conhecimento, investimento e indústria.

Alexandra Rodrigues, vice-presidente da CCDR Centro, acrescentou perspetivas sobre a gestão de fundos, salientando que o cluster terá um papel decisivo na identificação e estruturação de oportunidades de financiamento para empresas e startups que estejam a desenvolver soluções para a economia circular. Reforçou também a importância da articulação com outros clusters europeus e manifestou a ambição de criar uma feira internacional dedicada à promoção de serviços e tecnologias de circularidade, capaz de posicionar Portugal como um polo de referência.

A apresentação formal do CPC, conduzida por Filipa Figueiredo, diretora executiva do cluster, enquadrou a visão estratégica e operacional desta iniciativa. Definiu prioridades claras: reforçar a colaboração multissetorial, dinamizar projetos conjuntos, apoiar a digitalização verde das empresas e promover uma transição baseada em evidência científica e métricas robustas. Entre os setores destacados a fileira dos bioresíduos, dos têxteis e da construção mereceram destaque. Esta introdução estabeleceu o contexto ideal para o momento mais esperado do evento: a palestra de Miguel Brandão.

Circularidade: Entre Intuição, Dados e Complexidade
O keynote do professor Miguel Brandão, do Royal Institute of Technology (KTH) de Estocolmo, trouxe uma perspetiva aprofundada e provocadora sobre a avaliação integrada de sistemas, destacando a complexidade da medição da sustentabilidade. Partindo da evolução do uso global de recursos nos últimos 50 anos, mostrou que o mundo está longe de atingir um ponto de inflexão na redução da exploração de matérias-primas, e que os combustíveis fósseis continuam a dominar o panorama energético. Apesar do crescimento das renováveis, a dependência global mantém-se elevada.

Brandão partilhou um conjunto de lições contra-intuitivas derivadas de análises de ciclo de vida (ACV), demonstrando que escolhas aparentemente sustentáveis podem, em determinados contextos, gerar impactos maiores do que as alternativas convencionais. Exemplos como a comparação entre carne produzida localmente versus importada, o impacto real dos biocombustíveis ou os limites da substituição do plástico evidenciam a necessidade de uma abordagem mais rigorosa e menos intuitiva.

Sublinhou que a ACV não é uma ciência exata: existe uma multiplicidade de métodos, alocações e modelações possíveis — chegando a identificar mais de 12 formas diferentes de estruturar um mesmo estudo —, o que pode gerar resultados contraditórios. Por isso, defendeu maior harmonização metodológica, mais transparência e a inclusão de impactos socioeconómicos, evitando transferências de impacto que criam ilusões de sustentabilidade.

Alertou ainda para o risco crescente de greenwashing, incentivando as organizações a fundamentar as suas estratégias em indicadores robustos e não em narrativas simplificadas. Segundo o especialista, a economia circular só traz benefícios reais quando as decisões são baseadas em sistemas completos e não apenas em partes do processo.

A sessão de encerramento, conduzida por José Francisco Rolo, reforçou o compromisso local e institucional com a dinâmica que o CPC pretende criar. Entre o dinamismo que o BLC3 empresta ao município destacou o trabalho realizado nos resíduos têxteis e a ambição consolidada 10 anos após a distinção no Regiostars em várias fileiras dos resíduos.

Digimatria e Garcia: Tecnologia, Materiais e Circularidade (na construção) em Ação
As possibilidades de sinergia entre o CPC e o trabalho desenvolvido pela Garcia (na construção) revelam-se em duas frentes complementares. No projeto Digimatria, a reconstrução exploratória do gémeo digital de revestimentos e a manutenção preditiva de edifícios industriais permitem prolongar significativamente a vida útil de fachadas e coberturas.

Paralelamente, na atividade da Garcia, a procura de soluções verdadeiramente circulares já se materializa em exemplos concretos. A Base Circular, resultante de uma simbiose industrial entre a LIPOR e a Harsco, demonstra como resíduos desclassificados em subprodutos podem dar origem a um material de elevado desempenho mecânico, capaz de competir com soluções tradicionais enquanto incorpora princípios de circularidade profunda.
Juntas, estas abordagens — prolongamento da vida útil de materiais e criação de materiais circulares robustos — refletem o potencial do setor da Construção para transformar práticas e acelerar a transição que o CPC pretende impulsionar.



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